Tecnologias disruptivas impulsionam a transformação digital na construção civil

Gabriela Souza / 26 de abril de 2022

Realidade virtual, metaverso, blockchain e inteligência artificial estão trazendo disrupções para a sociedade e, também para a construção civil. Nesse setor, as empresas precisam acompanhar essa evolução tecnológica para maximizar competitividade, melhorar a experiência de seus clientes e serem mais sustentáveis. Mas como fazer isso? 

Para jogar luz sobre o movimento de transformação digital em curso, a Rede Construção Digital, Industrializada e Sustentável (RCDI+S) promoveu um workshop com mais de 300 profissionais, representantes das empresas participantes da rede, que atualmente é o maior ecossistema de relacionamento setorial e inovação no setor da construção brasileiro.

A vez do metaverso

Mediado por Roberto de Souza, CEO do CTE, o evento realizado em 12 de abril buscou analisar as macrotendências tecnológicas para entender como o setor da construção pode se aproveitar delas.

A programação teve início com palestra de Fernando Godoy, fundador da Flex Interativa, sobre o metaverso. Trata-se de um espaço coletivo composto de realidade virtual, aumentada e inteligência artificial, conectado à Internet, que replica a realidade através de dispositivos digitais. 

Discutido há algum tempo no campo da ficção científica, o metaverso cria oportunidades para o desenvolvimento de novas formas de aprender, trabalhar, vender e socializar a partir da maior integração entre o mundo físico e o digital.

“No metaverso, as marcas poderão interagir de forma turbinada se comparada ao que ocorre hoje nas mídias sociais. Será possível visualizar produtos 3D, conversar com assistentes virtuais para tirar dúvidas, jogar um game para ganhar desconto, etc.”, disse Godoy. Segundo ele, a chegada da Internet 5G e o lançamento de novos dispositivos vestíveis, provavelmente óculos mais leves e com alta capacidade de processamento, impulsionarão as aplicações no metaverso. Como consequência, será possível, por exemplo, construir jornadas gamificadas muito mais interativas para clientes e colaboradores.

O novo universo que se abre com o metaverso também traz desafios. Entre eles estão os problemas de interoperabilidade, uma vez  que a tendência é a de que existam vários metaversos descentralizados. “Há, também, a necessidade de buscar equilíbrio para evitar a alienação dos usuários”, pontuou Godoy. Na visão dele, o metaverso e a Web 3.0 — aquela que incorpora inteligência artificial à Internet — são o próximo hype. “Para a empresa que pensa em explorar essas  tecnologias, o melhor momento para começar foi ontem. A economia virtual já e uma realidade”, avisou o executivo da Flex Interativa.

Um marco importante para o desenvolvimento do metaverso foi o aumento do poder de processamento gráfico dos equipamentos, permitindo rodar aplicações 3D em computadores pessoais e em dispositivos móveis. “Com a evolução tecnológica, vimos ser possível criar todo tipo de sensação com a imersão digital”, explicou Igor Macedo, CTO na IM Designs. Segundo ele, o metaverso é, essencialmente, o mundo digital espacializado que se abre para as pessoas como extensão dos seus sentidos. “Quando pensamos nas interfaces 2D, temos pontes, como teclados e mouses, que fazem a transição entre os sentidos humanos e as plataformas computacionais. O metaverso explora a ideia de que não precisamos mais desses intermediários. A tecnologia vai estar embarcada no nosso corpo, por meio de  óculos, por exemplo”, comentou ele. 

Nos setores de arquitetura e construção, as aplicações da realidade virtual e aumentada representam um passo importante em direção ao metaverso. “Elas vão desde a substituição de apartamentos de exposição por realidade virtual no estande de vendas à utilização de interface tridimensional para comparar diferentes composições de cores em um ambiente, conferindo uma experiência muito mais rica do que a análise de um catálogo estático”, citou Macedo. 

Blockchain no mercado imobiliário

Entre as macrotendências tecnológicas que estão agitando o mercado, a blockchain e a tokenização de ativos chamam a atenção. A aplicação dessas soluções no mercado imobiliário tem crescido, impulsionada por benefícios como maior liquidez, desburocratização das transações e segurança, comentou Hugo Pierre, CEO na Growth Tech.

Em operações de compra e venda de imóveis, a tokenização permite dividir uma unidade imobiliária em um conjunto de frações convertidas em tokens que podem ser adquiridos por pessoas diferentes. O modelo prevê a constituição de um condomínio da unidade a ser gerenciado por uma administradora, que fica encarregada de fazer a distribuição do resultado de sua gestão a cada um dos coproprietários. “Trata-se de uma forma de pulverizar a venda e contribuir para a redução de estoque imobiliário”, argumentou Pierre, lembrando que o fracionamento de unidades também pode ser utilizado em permutas, em negociações de distrato e em operações de garantia. Todas as transações são reguladas por smart contracts, que diferente dos contratos convencionais firmados em papel, são escritos em códigos de computador autoexecutáveis, permitindo definir regras, obrigações e penalidades às partes envolvidas. 

Câmeras inteligentes

Aplicações avançadas de inteligência artificial e machine learning na captura e processamento de imagens foram apresentadas por Reno Bertolucci, engenheiro de pré e pós-vendas na Dahua. Com esse tipo de tecnologia embarcada, câmeras de monitoramento tornaram-se capazes de distinguir pessoas, veículos, animais e, até mesmo, árvores balançando. Tudo isso para evitar alarmes falsos. Os equipamentos mais modernos também conseguem extrair metadados de pessoas e veículos para realizar buscas dirigidas.

De acordo com Bertolucci, duas tecnologias, em especial, têm bastante aderência com as necessidades das construtoras. A primeira consiste na combinação de câmeras inteligentes e de drones para fazer a captura de imagens para a modelagem tridimensional de ambientes. Também se destacam os equipamentos com algoritmo embarcado que fazem a detecção do uso de equipamentos de proteção individual (EPI) e emitem alertas em caso de não conformidades.

Arquitetura corporativa

Na cadeia da construção civil, a MRV se destaca como uma das empresas mais avançadas no processo de transformação digital. Reinaldo Sima, CTO da construtora, compartilhou com os participantes da RCDI+S, algumas lições aprendidas ao longo dessa jornada.

Segundo ele, para viabilizar a transformação digital, as empresas precisam desenvolver um framework de trabalho baseado em alguns elementos centrais. “A tecnologia é um deles. Mas é importante que ela seja encarada como meio e esteja conectada com o propósito da companhia e com os processos onde ela está inserida”, comentou Sima. 

Para as empresas inseridas nesse processo de mudança, o CTO da MRV recomenda: 1) orientar as equipes para trabalhar com APIs e microsserviços; 2) focar em produtos digitais, em vez de projetos; 3) ter como objetivo o sucesso do usuário, criando mecanismos de monitoramento contínuo e prevenção de incidentes. “Um grande desafio é garantir a segurança cibernética. Para isso, é fundamental trabalhar com tecnologias seguras e desenvolver planos de mitigação e  de recuperação em caso de acidentes”, salientou Sima.

A expansão do BIM

Após uma tarde farta em debates e apresentações, o workshop da RCDI+S terminou com palestra da professora Regina Ruschel, da Unicamp, sobre o estágio de maturidade do BIM no mundo. Ela citou que, em 2017, o Brasil não estava bem posicionado, em comparação a outras nações mais desenvolvidas, embora já contasse com tecnologia disponível, lideranças engajadas e esforço para desenvolvimento de bibliotecas. O país se destaca, contudo, quando a comparação se restringe à América Latina, como mostrou um trabalho realizado por Ruschel, em conjunto com Fernanda Machado e Joyce Delatorre, da Autodesk. O diagnóstico que tomou como referência as publicações realizadas em 18 países, detectou que  Brasil, Chile, Argentina e México se sobressaem com relação aos demais vizinhos por possuir estratégias nacionais de adoção do BIM. Ainda há muito o que avançar em maturidade BIM, especialmente pela necessidade de haver uma mudança cultural. “Essa barreira só será eliminada com baby steps e uma estruturação das empresas voltada para a transformação”, disse a Ruschel, segundo a qual, a modelagem da informação da construção é um dos blocos fundamentais para a Indústria 4.0 na construção, já que ela organiza processos e fluxos de informação. “A reorganização de processos induzida pelo BIM é chave para a introdução de tecnologias associadas, como ambientes de colaboração em nuvem, big data, manufatura aditiva, entre outras”, finalizou a professora.

ator Gabriela Souza

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