O impacto do aumento dos custos de materiais na incorporação e na construção

Gabriela Souza / 21 de abril de 2021

O forte aumento de preços de insumos básicos tem tirado o sono de construtores e incorporadores em função de seus impactos no custo das obras e, consequentemente, no preço de venda dos imóveis. 

Resultado de uma combinação de fatores que incluem a desorganização das cadeias produtivas, o incremento de demanda interna e a valorização global no preço das commodities metálicas, essa elevação tem se refletido no INCC (Índice Nacional de Custo da Construção), que acumulou alta de mais de 12% no período entre março de 2020 e março de 2021.  

“Se olharmos apenas para materiais, equipamentos e serviços, os custos subiram 22%. Aumentos tão significativos em curto espaço de tempo podem gerar grandes desarranjos organizacionais”, disse Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção na Fundação Getúlio Vargas/IBRE. A economista foi uma das participantes do primeiro webinar do ano realizado pelo CTE enredes. Com mediação de Roberto de Souza (CTE), o evento realizado no último dia 15 abril buscou mapear os efeitos da elevação dos custos de materiais e as estratégias para garantir equilíbrio financeiro em um contexto tão desafiador.  

DESLOCAMENTO DO INCC 

“O INCC é um retrato de um determinado momento e uma composição de índices de sete capitais nacionais com pesos distintos”, explicou Castelo. Segundo ela, “uma inflação média nunca reflete a inflação específica. Por isso, em momentos de forte elevação de preços, a sensação de deslocamento é maior”. 

De fato, o que as empresas relatam é uma pressão de preços ainda mais drástica do que a apresentada pelo INCC. “Isso tem a ver, em parte, por diferenças de tipologia”, comentou Emílio Fugazza, diretor financeiro e de relações com investidores da Eztec. “O INCC tem uma influência importante de habitações horizontais e de edifícios baixos. No entanto, no nosso caso, trabalhamos com projetos de grande magnitude, torres altas com 30 a 50 mil m² de área privativa. Além disso, o índice é considera uma influência maior da mão de obra em relação aos materiais”, disse ele.  

No segmento de atuação da Eztec, exclusivamente na região metropolitana de São Paulo, o incremento dos preços nos últimos oito meses foi assustador, contou Fugazza “Essa elevação não é facilmente absorvida sem repasse para o preço dos imóveis. Nos melhores bairros de São Paulo, o metro quadrado privativo girou entre R$ 7 mil e R$ 8 mil em 2020. Para 2021, os preços devem chegar à casa dos dois dígitos nessas mesmas localidades”, disse o executivo. 

“Nos últimos doze meses, o aço aumentou cerca de 43% e os insumos para instalações prediais encareceram 33%. Também houve aumento 20% em cimento e agregados 20% e de 14% em materiais de acabamentos”, contou Milton Meyer, CEO MPD. Ele ressaltou que a elevação do preço dos principais insumos gerou um descompasso entre os custos da MPD e o INCC da ordem de 8 a 12%. “Como resultado dessa situação há um esforço das empresas para renegociar os contratos renegociáveis. Quando isso não é possível, a saída passa por redução de margens de lucro e aumento de preços dos imóveis”, revelou Meyer. 

“No segmento de habitação popular e de interesse social, o reflexo ao aumento de preços é a migração das empresas para os empreendimentos que atendem faixas de renda mais altas”, revela Flávio Alcântara, diretor da Vitta/Bild. Ele contou que na Vitta, os empreendimentos mais econômicos representavam 70% do portfolio no passado. “Agora isso já chega em 50%, o que mostra nossa migração para empreendimentos de maior valor”, disse Alcântara.  

“No segmento de habitação econômica, essa elevação de preços põe em risco o compromisso social com a população que precisa de moradia e o sucesso do programa federal de habitação popular que tem sido importante para reduzir o enorme déficit habitacional brasileiro”, alertou Roberto de Souza. 

O QUE ESPERAR PARA O FUTURO? 

Na visão de Emílio Fugazza, os preços dos insumos e materiais de construção devem se realinhar, mas não se pode esperar que os preços irão baixar a patamares de um ano atrás. “O IGP-M na faixa de 30% ao ano dá ideia de que tudo está desajustado”, argumentou.  

“O que mais me preocupa é olhar para o futuro. O nosso segmento precisa andar para frente, até porque possui uma importância enorme para a retomada da economia. Os preços ainda não estabilizaram, impondo desafios para a precificação de novas obras e corroendo as margens que já são pequenas”, salientou Milton Meyer. 

Construtores e incorporadores devem se preparar, ainda, para cenários ainda mais ameaçadores em função de um possível aumento dos custos de mão de obra em 2021. “Se no ano passado a mão de obra teve variação de menos de 3%, esse ano esperamos o dobro disso, o que irá pressionar ainda mais o INCC”, disse Ana Castelo. Para o curto prazo, a economista recomendou às empresas adotar modelos paramétricos para cada obra incorporando diferentes índices pesquisados. 

PLANO PARA MINIMIZAR OS DANOS 

Para passar por esse momento com resiliência, algumas estratégias ajudam bastante. Milton Meyer citou, como exemplos, o aprimoramento das ferramentas de gestão, o uso de tecnologias como o BIM para dar assertividade aos projetos e o investimento em capacitação de pessoal. “Além disso, o momento mostra o valor de firmar parcerias estratégicas com fornecedores”, destacou o CEO da MPD. 

“A inflação nos obriga a buscar reduzir os custos de materiais, por meio da inovação, revisão de processos e introdução de novas tecnologias”, acrescenta Flávio Alcântara. Outras ações recomendadas pelo executivo da Vitta são não deixar muito capital alocado em terrenos e buscar um equilíbrio entre o ciclo de incorporação com a capacidade de pagamento do cliente. 

O provável aumento do custo da mão de obra, que deve vir com força no futuro próximo, também deve induzir as empresas a darem mais atenção à industrialização. “Vamos ver uma reindustrialização em muitos setores, inclusive na construção. É provável que daqui a dois ou quatro anos, o nosso nível de industrialização tenha aumentado bastante”, comentou Fugazza.  

Clique aqui para assistir na íntegra o webinar “O impacto do aumento dos custos de materiais na incorporação e na construção”.

Anote em sua agenda! O próximo webinar do CTE enredes acontecerá no dia 29/abril, com transmissão no canal do CTE enredes no YouTube.

ator Gabriela Souza

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