Como viabilizar a industrialização da construção no segmento residencial? Case Urbic indica caminhos

Gabriela Souza / 31 de agosto de 2022

A industrialização da construção é vista como uma saída para o setor responder a desafios importantes como baixa produtividade, elevado desperdício e escassez de mão de obra. Em maior ou menor grau, em segmentos como o industrial e o comercial, já é possível encontrar empreendimentos construídos com componentes off-site, produzidos fora do canteiro. No mercado residencial, porém, ainda predominam métodos construtivos artesanais, seja por resistência cultural, seja por motivos financeiros.

A jornada da Urbic, construtora e incorporadora que atua em São Paulo, está quebrando esse paradigma. Fundada há três anos e meio, com três edifícios entregues, a empresa é liderada pelo engenheiro Luiz Henrique Ceotto, que tem uma longa trajetória em prol da industrialização da construção. 

Ceotto foi o convidado de Bob de Souza no 11.º episódio da série Diálogos com a Construção. Na oportunidade, ele explicou o modelo de negócio da Urbic, baseado na construção rápida de edifícios com até 20 pavimentos em terrenos de 600 m² a 1200 m² localizados em áreas nobres da cidade. 

A Urbic trabalha com um ciclo de produção de ⅓ do tempo normalmente adotado pelo mercado imobiliário. A compra do terreno acontece no instante 0 e, em dois meses, o projeto é submetido à aprovação na Prefeitura. Obtida a licença, as obras são iniciadas com duração entre 8 e 14 meses.

Para viabilizar tal ritmo, a construtora se inspirou na indústria automobilística, com a estrutura de aço funcionando como chassis. A esse elemento, construído com elevado grau de precisão, são acoplados os demais sistemas, a maioria deles também industrializados. Os projetos são todos modelados e compatibilizados em BIM.

“Executamos até quatro lajes por semana e conseguimos um índice de produtividade entre 1 e 1,2 h.h/m²”, contou Ceotto, informando que o custo de seus empreendimentos é de 7% a 8% superior em comparação a uma obra convencional. “Essa diferença se deve, principalmente, à distorção tributária que penaliza o uso de sistemas industrializados. Enquanto os produtos industrializados pagam de 12% a 20% de ICMS e IPI, a produção artesanal no canteiro paga entre 2 a 5% de ISS. Isso é um incentivo ao uso de processos obsoletos”, lamenta Ceotto. “A expectativa, porém, é a de que esse desarranjo se resolva em uma reforma tributária. Isso fará com que a construção industrializada fique mais competitiva e custe menos do que a convencional”, afirmou o engenheiro.

Em função do forte aumento do preço do aço registrado desde 2021, a Urbic precisou ajustar um de seus projetos para uso de estrutura pré-fabricada de concreto. Segundo Ceotto, embora seja uma solução industrializada, o pré-fabricado de concreto não garante a mesma precisão que a estrutura de aço. Tanto que a mudança no sistema estrutural nesse empreendimento implicou em um acréscimo de tempo de construção de quatro meses.

Fornecedores de sistemas

Em um mercado não habituado a trabalhar com foco em agilidade, há diversos desafios enfrentados pelas construtoras para viabilizar obras rápidas. Um deles diz respeito à formação dos arquitetos, que não saem das universidades com uma visão direcionada à construção industrializada.

Outro obstáculo é o relacionamento com os fornecedores. “A quantidade de itens para montar um carro e para construir um edifício é parecida, em torno de 4 mil itens. Mas enquanto a indústria automobilística trabalha com, no máximo, 12 fornecedores, a construção civil administra mais de 200 fornecedores. Na Urbic, conseguimos reduzir esse universo para 40 a 50 fornecedores, mas queremos diminuir esse número ainda mais”, disse Ceotto, explicando que tal redução é necessária para agregar mais valor às parcerias. 

“A industrialização exige colaboração e relações sólidas entre construtores e fornecedores. Nesse sentido, conseguimos importantes parcerias com fornecedores de estrutura metálica, fachada pré-fabricada, drywall e sistemas hidráulicos e elétricos. Mas ainda falta de engajamento de outros elos da cadeia, como serralheiras, fornecedores de revestimentos e de bancadas”, avaliou Ceotto. Segundo ele, a industrialização oferece possibilidades fantásticas para obtenção de ganhos de produtividade. “Mas para isso acontecer, é necessário fomentar o desenvolvimento tecnológico através da cooperação da cadeia”.

Tanto Ceotto, quanto Bob de Souza, enfatizaram que a industrialização da construção é uma prática de responsabilidade social e ambiental, conectada com o ESG (Environmental, Social and Governance). Isso porque ela reduz desperdício, induz a qualificação da mão de obra e diminui drasticamente as tarefas penosas e insalubres. “Sem industrializar, não é possível falar sobre ESG com consistência”, enfatizou Ceotto. Ele lembrou  que o aumento de produtividade é uma condição, por exemplo, para elevar a remuneração dos trabalhadores da construção.

Além do ESG, a escassez de mão de obra é outro impulsionador da construção industrializada. “Em São Paulo, por exemplo, os filhos de pedreiro, de carpinteiro e de mestres de obra não querem seguir carreira como operários da construção. Isso vai gerar um problema sério em um intervalo de cinco anos, obrigando as empresas a prestarem mais atenção em soluções que sejam menos dependentes de mão de obra”, alertou o executivo da Urbic.

Se você perdeu o 11º episódio do Diálogos com a Construção, não deixe de conferir a gravação do encontro no canal do enredes no YouTube!

ator Gabriela Souza

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